Desde domingo, quando o
repórter Lucas Ferraz contou que a Viúva construiu uma pista de pouso asfaltada
no município de Cláudio (MG), a 6 km da fazenda centenária do ramo materno da
família de Aécio Neves, o candidato tucano à Presidência da República ofereceu
explicações insuficientes para satisfazer a curiosidade de uma pessoa que
pretenda votar nele em nome do seu compromisso com a gestão e a transparência.
Situações desse tipo afloram em campanhas eleitorais, e a maneira como os
candidatos lidam com elas instrui o julgamento que se faz deles.
“O candidato tucano ofereceu
explicações insuficientes para satisfazer a curiosidade de uma pessoa que
pretenda votar nele em nome do seu compromisso com a gestão e a transparência”
O campo de aviação de
Cláudio fica a 120 km do aeroporto de Confins e a 36 km da pista bem equipada
de Divinópolis. Lá estão as terras da família Tolentino, na qual nasceu
Risoleta, avó de Aécio e mulher de Tancredo Neves. Ela morreu em 2003, deixando
no espólio a fazenda da Mata, recanto onde seu neto às vezes se refugia. A obra
custou R$ 13,9 milhões ao governo do Estado e foi concluída em 2010, quando ele
o governava. No ano anterior, segundo o IBGE, a receita orçamentária realizada
do município foi de R$ 26,3 milhões.
Aécio respondeu com uma
generalidade: “Tudo foi feito com a mais absoluta transparência e correção”.
Juntou uma redundância: “O aeroporto foi construído em área pertencente ao
Estado, não havendo, portanto, investimento público em área privada”. Finalizou
com uma precipitação: “Já foi tudo explicado”.
Por enquanto, há em Cláudio
uma pista de 1 km, capaz de receber jatinhos de até 50 lugares, sem equipamento
ou homologação da Anac. Falta explicar é a necessidade de a Viúva ter
construído essa nova pista naquelas terras. A área foi desapropriada em 2008.
Sem isso, a obra não poderia ter sido custeada pelo governo do Estado. Os
Tolentino disputam o valor oferecido pelas terras (R$ 1 milhão). Uma peritagem,
ainda que tardia, poderá resolver a questão. O próprio candidato argumenta que
“aeroportos locais, que não possuem voos comerciais, ou pistas de pouso
fechadas são prática comum em aeroportos públicos no interior do país, como
forma de evitar invasões (…) que possam oferecer riscos à segurança dos
usuários”. Tem toda razão e leva ainda o mérito de expor uma questão
relacionada com os investimentos públicos em pistas que só recebem aviões
privados. Talvez Cláudio precisasse de uma. Do jeito que está, recebe
irregularmente uns dois aviões por semana. O ex-governador informa também que
não se tratou de construir uma nova pista, mas apenas de modernizar outra, de
terra, feita em 1983, quando seu avô era governador e um Tolentino, prefeito da
cidade. A Viúva não deve ter ficado com essa conta, pois a terra era privada.
A comodidade de uma pista de
pouso paga e mantida pela Boa Senhora é o objeto do desejo de todo fazendeiro.
Tome-se, porém, o exemplo de Paul Mellon, um finíssimo bilionário que vivia
entre seu haras da Virgínia e o mundo. Comprou um avião e, para seu conforto, construiu
um aeroporto dentro de suas terras, em Upperville. Lá, avisa-se: “Uso privado.
É necessária autorização para pousar”.
Mellon fez o aeroporto com o
dinheiro dele. A pista de Cláudio, como diria Armínio Fraga, foi construída com
o “meu, o seu, o nosso”.
Elio Gaspari é colunista do
jornal Folha de S. Paulo no qual esse artigo foi originalmente publicado na
edição de 23/07
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