quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Manoel Silvino: 'Prefeitos estavam sendo enganados’

À frente da Associação Tocantinense dos Municípios (ATM), o prefeito de Tocantínia, Manoel Silvino Neto (PR), nesta entrevista à Tribuna, fala dos principais desafios que terá como presidente da associação. Um dos primeiros desafios, diz, é o de reaver recursos que deixaram de ser repassados às prefeituras pelo governo nos últimos quatro anos. Silvino também fala sobre as dificuldades vividas pelos prefeitos, nas áreas de Educação - com problemas no transporte escolar -, Saúde e Saneamento, devido à exigência da construção de aterros sanitários municipais até o fim do ano. “A maioria absoluta dos municípios não tem condições financeiras para honrar este compromisso”, desabafa. O processo eleitoral e a relação com o governo também foram assuntos destacados pelo presidente.

Tribuna do Planalto – O que os prefeitos do Tocantins podem esperar desta nova gestão da ATM?Manoel Silvino – Esperamos atender a contento todos os colegas. Eles têm reclamado bastante da falta de assistência na área técnica, para que eles possam elaborar seus projetos para captação de recursos e também para atender a demanda dos municípios em todos os ministérios. Já começamos a fazer este trabalho, estamos fazendo parceria com a Secretaria Estadual de Educação e Undime e agilizando seminários que possam estar informando os prefeitos sobre os recursos disponíveis na área de Educação.Este foi um dos primeiros passos na área de Educação feito pela ATM. Acredito que só este convênio para capacitação técnica não é o suficiente, mas este especificamente na área de Educação vai trazer informações importantíssimas e isso irá fazer com que os prefeitos acompanhem junto com a Undime e a ATM a viabilização destes projetos.

O sr. denunciou recentemente que o governo passado deixou de repassar recursos aos municípios. Que recursos foram esses?Estamos correndo atrás para receber estes recursos que deixaram de ser repassados aos municípios. Na área de transporte escolar, já foi assinado pelo atual governo o pagamento que ficou atrasado, está sendo estudado agora a forma como será paga. Tem município do Estado que ficou até cinco meses sem receber as parcelas do transporte escolar e isso comprometeu o andamento das escolas nos municípios. Outro exemplo em que os governos anteriores burlaram os municípios foi a aprovação de uma lei que permitiu que o governo fizesse as compensações entre os créditos existentes com a empresa de energia elétrica e com as empresas de comunicação, e os débitos que o Estado tinha com a empresa Celtins. O Estado tinha, por exemplo, R$ 700 mil de crédito e R$ 650 mil de débito, mas só se lançava os R$ 50 mil restante na receita do Estado, e não os R$ 700 mil, burlando assim os municípios com o restante que não ia para o bolo. E esta parte os municípios não recebia, o governo pagava suas contas com estes recursos. Os prefeitos estavam sendo enganados. O Estado precisa repassar do bolo total 25% aos municípios e isso é repassado de acordo com o percentual de cada um.

Como fazer para rever estes recursos que deixaram de ser repassados?O Governo do Estado determinou junto à Secretaria da Fazenda para identificar o valor devido a cada município para encontrar a forma mais viável de estar pagando isso, porque acumulou muita coisa, ao longo de quatro anos. Ficou decidido que vai sentar com a ATM e decidir como será pago, porque o Estado não tem como pagar de uma vez só. Então, vai ser parcelado, dentro da possibilidade que o Estado possa honrar o compromisso que os governos anteriores não cumpriram ao longo de quatro anos.

Os prefeitos não haviam percebido antes sobre a irregularidade deste repasse?Nós só descobrimos porque o governo que assumiu agora identificou que eles estavam fazendo esta prática. Existe uma lei, a Lei 1745, que permite que o Estado faça a compensação, mas o Estado foi mais longe, ele burlou, porque no momento que começou a fazer isso estava prejudicando todos os municípios. Estes governos omitiram suas receitas.

Atualmente, qual o maior desafio dos prefeitos do Tocantins?Hoje, temos vários problemas e de difícil solução para os municípios. Por exemplo, existe um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado que determina que até o final do ano todos os municípios terão que construir seus aterros sanitários, mas a maioria absoluta dos municípios tocantinenses não tem condições financeiras para honrar este compromisso. Então, o que é necessário? É necessário que haja uma força tarefa onde a União venha se juntar com os municípios, a Funasa, orgão que trabalha com saneamento, venha assim disponibilizar recursos para que os municípios possam estar fazendo em parceria com a União. Do contrário, prefeitos vão ser penalizados porque não conseguem honrar este compromisso. Este é um dos gargalos das prefeituras. Outra questão é a do transporte escolar, porque os municípios não têm condições de se adequar às exigências das leis, comprando ônibus e disponibilizando em todas as suas rotas de transporte escolar sem que haja também uma parceria entre o Estado, União e as prefeituras.

No ano passado foram entregues dois ônibus a cada município. Estes veículos conseguem atender parte da demanda?De certa forma, ajudou. Só que ocorre o seguinte: no meu município, por exemplo, Tocantínia, são oito rotas e foram encaminhados dois ônibus ao município, ou seja, seis ficaram para o município bancar e não damos conta de adquirir ônibus para isso tudo, os demais tivemos de locar, o que é não é o mais adequado.

Quanto à Saúde, estes municípios do interior têm hoje condições de oferecer ao menos atendimento básico à sua população?Os municípios que mais sofrem com a questão da Saúde são aqueles que têm hospital de pequeno porte. Por quê? O Governo anterior transferiu esta responsabilidade para os municípios e eles não têm como bancar um hospital. Os recursos deles hoje são insuficientes para isso. Não havia a parceria com o Estado. A informação que temos agora, estamos acompanhando, é que a nova gestão está direcionando um novo tratamento para esta questão, firmar parcerias com os municípios para viabilizar o funcionamento de hospitais de pequeno porte. A partir do momento que isso começar a funcionar a contento nestes municípios vai desafogar o Hospital Geral de Palmas. Todos corriam para Palmas porque não havia atendimento em outros municípios, e não só do Tocantins, mas também do Maranhão, Pará e Mato Grosso. Quanto às Unidades de Saúde da Família estas funcionam, mas sabemos que em alguns municípios, principalmente os mais distantes da Capital, há dificuldades de se ter um médico residindo na cidade, para que possa atender no posto. Aí é que a concorrência é desleal: um médico para ir para Lizarda cobra R$ 25 mil do prefeito e a prefeitura não tem como arcar com isso, e acaba ficando sem o médico. Meu município, por estar mais próximo, o valor cobrado é de R$ 15 mil. Os mais distantes acabam sofrendo mais.

Quais são hoje às reivindicações junto ao governo federal?Uma questão que os municípios muito precisam é revitalizar suas receitas, elas estão comprometidas e sem condições de manter em dia suas obrigações por falta de recursos. Então, temos demanda hoje que já se arrasta há mais de dez anos, caminhando para Brasília em busca de uma distribuição de melhor dos recursos da União para os municípios. Infelizmente, não temos tido êxito, mas vamos dar mais ênfase para isso, para que se mude a forma de distribuir os recursos da União. O Governo Federal sabendo que a Constituição fala que todos os impostos precisam ser distribuídos entre a União, estados e municípios passou a criar as contribuições em vez de impostos. Estas contribuições não são divididas, ou seja, uma forma de driblar e comprometer as finanças dos municípios.

E como tornar os municípios mais independentes?A solução para isso é a reforma tributária, um novo pacto federativo, onde as receitas sejam distribuídas de forma a atender seus entes federados. Não adianta o governo hoje querer repassar o valor que repassa aos seus municípios e colocar nas costas dos municípios as responsabilidades que são colocadas hoje. Todos os programas sociais do Governo Federal desembocam nas prefeituras, aí o município tem despesa e não tem recursos para cobrir. Então, um novo pacto federativo, onde venha sair uma distribuição mais justa, pois é no município que acontecem os problemas. Não adianta a gente ficar correndo com um pires na mão para Brasília.

Outra grande reivindicação é pelo repasse do FPM. Como está a situação hoje?Em 2010, nós trabalhamos com a mesma receita que trabalhamos em 2008, só que em 2010 as despesas foram totalmente diferentes e a gente não consegue cumprir, não consegue equacionar estas contas. É isso que precisa ser mudado, pois a partir do momento que você desenvolve uma nova ação no seu município você consequentemente está desenvolvendo mais despesas. O salário mínimo de 2008 era um e o de 2010 outro, ele já tinha subido mais de duas vezes e a receita continua a mesma. A população cresce, o valor da energia é outro, do combustível também subiu e a receita estagnou. Aí não tem administrador que consiga sobreviver a isso.

O sr. foi eleito de uma forma consensual para a presidência. Como se chegou a esta decisão?Nós tínhamos seis colegas que tinham a mesma pretensão que a nossa, dentro das discussões que estávamos tendo, chegamos ao entendimento que o pensamento de todos convergia para o mesmo interesse: que é o fortalecimento da instituição e a busca de mecanismo que viabilizasse nossas administrações. Então, o entendimento foi de que uma disputa naquele momento não era interessante para a instituição e nós tínhamos que caminhar abraçados para conseguir alcançar nosso objetivo. Na administração passada houve vários desentendimentos no processo eleitoral, mas depois o prefeito Valtenis conseguiu fazer uma administração com bastante coerência e harmonia. Tanto é que quando ele assumiu tinha 82 filiados e repassou para mim com 103, o desafio para mim é buscar os outros que estão faltando.

Após as eleições na ATM, os prefeitos foram recebidos pelo governador Siqueira Campos. O que ele ofereceu de respaldo?O que ele nos colocou, quando nos recebeu, foi que o Governo do Estado vai estar aberto para dialogar e trabalhar juntos com os municípios. Nós estamos esperançosos e depois disso ele já deu sinal de que tem esta pretensão, quando o próprio governo nos informou sobre esta conduta irregular feita pelos governos anteriores e já determinou à Secretaria da Fazenda que fizesse a correção imediata a partir de 1º de janeiro. Então, vemos que existe uma boa vontade de fazer um tratamento harmonioso entre governo e municípios.

A realidade dos municípios tocantinenses se difere em algo dos demais do País?Nós temos uma situação diferenciada pelo seguinte: quando houve a divisão do Estado nós tínhamos um número de municípios e depois foram criados outros junto com o Estado, no entanto, para que fosse melhor distribuída a receita dentro do próprio Estado pegou aquele bolo que vinha para o FPM que era para X e se distribuiu para Y. O menor FPM é o do Estado do Tocantins. Esta é uma das nossas maiores brigas, para conseguirmos distribuir estes recursos de forma igualitária.

Fonte:Jornal Tribuna do Planalto

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