domingo, 9 de dezembro de 2012

ARTIGO: ABORDAGEM JURÍDICA SOBRE O PROCESSO DA FARRA DAS DIÁRIAS EM DIANÓPOLIS E SEUS REFLEXOS ELEITORAIS


Padecem eleitores, sociedade e candidatos, em Dianópolis, em decorrência da morosidade e julgamento da ação criminal intitulada “Farra das Diárias”, que se dará, ao que se observa,  posteriormente aos atos de diplomações, previstos para o dia 18.12.2012. Sobrevela destacar que o sentenciamento dos referidos autos produziriam inúmeros reflexos, em todo o processo eleitoral, implicando em cassações ou impedimentos de diplomação e, até mesmo, posse de candidatos.
 

O conhecido processo da Farra das Diárias em Dianópolis, que culminou com o afastamento temporário de 04 vereadores, dentre eles o candidato Régis Melo, se arrasta pelas prateleiras do Poder Judiciário, ao sabor de manobras da defesa ou, quem sabe, de ingerências políticas externas. O certo é que tais práticas tumultuaram as eleições, favorecendo sobremaneira o referido candidato, que saiu da condição de Réu, indiciado em diversos crimes, para cair nas graças das plagas populares, sendo acolhido por esses como herói das multidões.
 
O caráter de urgência, numa resposta do Poder Judiciário, independentemente da necessidade de se atropelar as fases e garantias processuais, justifica-se em virtude dos prejuízos irreversíveis, que os demais candidatos poderão sofrer, com a possível diplomação do candidato Régis Melo, que passará a possuir foro privilegiado, do Tribunal de Justiça. Com isso, se beneficiará, de forma injustificável, em detrimento dos demais candidatos, já que ele deu ensejo à situação, e não poderia se beneficiar  da própria torpeza.
 
Enquanto isso, cria-se uma crise de insatisfação e descrédito, por entre uma sociedade, e até mesmo de supostos eleitos, que querem compor suas equipes de trabalho, realizar transição de governo. Todos permanecem de sobreavisos, aguardando o teor da sentença criminal, no referido processo da Farra das Diárias. Ressalte, mormente, levando em conta o acervo probatório contido, nos aludidos autos, que foram suficientes para, em decisão liminar do Dr. Ciro Rosa de Oliveira, no dia 02.06.2012, afastar 04 vereadores, mas não foram o bastante, para assegurar o julgamento do feito antes das eleições, evitando tantos desconfortos e criação de expectativas. Podere-se que, agora, mais uma vez, poderiam ter sido julgados, antes da diplomação, prevista para o dia 18.12.2012. Outrossim, ao que tudo indica, serão após, para garantirem foro privilegiado ao causador de todo o tumulto.

Não se pode ignorar os reflexos que gerarão a sentença criminal condenatória, antes mesmo do seu trânsito em julgado para o candidato Régis Melo, que poderá ser cassado ex officio, ou seja, independentemente que qualquer manifesto. Aliás, com a sua condenação, no curso da campanha, nas Ações de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), Representação nº 382-39.2 (012.6.27.0025) e Representação nº 383-24.2 (012.6.27.0025), por consequência da realização e divulgação irregular de pesquisa eleitoral, para captação ilícita de sufrágio, o aludido candidato sequer poderá ser diplomado, conforme se vê de decisão do Superior Tribunal Eleitoral:
 
O julgamento de procedência da AIJE anterior à diplomação dos eleitos gera a cassação do registro de candidatura, independentemente de seu trânsito em julgado (AgR-AI nº 10.963/MT, Rel. Min. Felix Fischer, DJe de 4.8.2009; AgRg-MS nº 3.567/MG, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 12.2.2008).

Transcreve-se, ainda, a parte conclusiva da sentença condenatória, acima mencionada, em relação à pesquisa formulada, no curso da campanha, para induzir e captar votos de forma ilícita:

[...] Ante o exposto, e com fulcro no art. 33, §§ 3º e 4º da Lei 9.504/97 e art. 18 da Resolução do TSE n.º 23.364/2011, JULGO PROCEDENTES as Representações formuladas pelas Coligações “Avança Dianópolis” e “A grande Transformação I” e CONDENO os Representados INSTITUTO GAUSS DE PESQUISAS SOCIAIS E DE ECONOMIA E DE OPINIÃO PÚBLICA LTDA, REGINALDO RODRIGUES DE MELO, MAGDA LUCIA GONÇALVES SILVA VALENTE e a Coligação “RUMO NOVO COM A FORÇA DO POVO”  a pena de multa, a qual arbitro em R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) para cada um, cujo pagamento  deve ocorrer no prazo de 10(dez) dias (art. 38, I da Lei 9.096/1995). [...]

Outra questão, que vem causando inquietação ao eleitor, seria a circunstância de, no caso de cassação de Régis Melo, dar-se posse ao segundo candidato mais votado, Hercy Filho, ou convocar novas eleições. Neste particular, quando se observa dos dispositivos da Lei de Ficha Limpa, (Lei Complementar n. 135-10) que, entre outras medidas, impede que pessoas condenadas em decisão colegiada se candidatem a cargos eletivos. Verifica-se, pois, que o segundo candidato mais votado, sequer poderia ter realizado o registro de sua candidatura, ante os antecedentes que possui, em virtude da rejeição de suas contas, no ano de 1983, nos autos n. 01687/95, quando de sua gestão na Prefeitura local, o que ocasionou a resolução n. 646-96, de 10.04.1996, do Tribunal de Contas do Estado, pugnando pela rejeição.
 
Cabe realçar que a Lei da Ficha Limpa torna inelegíveis os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável, que configure improbidade administrativa. Estão, na mesma condição, aqueles detentores de cargos públicos que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econômico ou político.
 
Reflita-se, enfim, que a convocação de um candidato não eleito para assumir o mandato, de um cargo para o qual não foi eleito, exsurge como uma verdadeira subversão da linha sucessória e um golpe na vontade do eleitor.

O Projeto de Lei n. 86/11, em trâmite na Câmara dos Deputados, da lavra do deputado Bernardo Santana de Vasconcellos (PR-MG), pugna pela realização de novas eleições quando o mandato de titular do Poder Executivo for cassado. O referido projeto objetiva alterar a Lei 9.504-1997, nos casos de cancelamento de registro ou cassação de diploma de candidato eleito, com a finalidade de sanar fraudes, nesta prática, convocando eleições suplementares. Nesses casos, segundo o projeto, a Justiça eleitoral considerará prejudicados os votos recebidos pelos outros candidatos que concorreram ao cargo e convocará novas eleições dentro de 20 a 40 dias após a cassação.

O candidato Hercy Filho, num de seus comícios, durante a campanha, em Dianópolis, fez um acinte, numa de suas costumeiras empáfias: “quem é o candidato Zilô!? É claro que não ficamos à vontade, para fazermos o mesmo questionamento, de quem é o candidato Hercy Filho?, e por isso, pedimos licença para recorrer às palavras isentas do conceituado jornalista, Carlos Henrique Furtado, do Sudeste Hoje, publicadas no Blog do Kiko, do seguinte teor:

[...] Recentemente, em uma Ação de Execução Fiscal nº 6160/04, o ex-prefeito Hercy Filho (PMDB), foi intimado a pagar uma multa referente aos anos em que foi prefeito e teve suas contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado. Esta rejeição gerou uma multa de R$ 33.000,00 (trinta e três mil reais) que o ex-prefeito (que não pagou o povo), não a pagou também e que, desde o ano de 2004 está correndo o processo na Vara Cível da Comarca de Dianópolis, já tendo sido citado para pagar ou ter que entregar seus bens a penhora. Atualizada, o valor da execução hoje ultrapassa os R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil reais).
 
As ações na Justiça, muitas delas pelo NÃO pagamento de dívidas, e uma em especial, cobram rejeição de contas, dívidas gigantescas na prefeitura, obras ilegais, contratação irregular de serviços, não pagamento do salário dos servidores. Este é o ex-prefeito HERCY FILHO.
 
Hercy Filho, o mesmo que sonha voltar para a prefeitura nessa eleição, nunca foi inocentado nem por juiz da ação de execução e nem pelo Tribunal de Contas do Estado. Respondeu já por várias ações de cobranças, algumas já extintas e outras em andamento, e mais uma execução fiscal por ato de improbidade e responsabilidade, por ter colocado o boné na cabeça e saído do governo deixando na prefeitura um rombo de dívidas, dentro os quais o de não ter feito os pagamentos obrigatórios para os funcionários públicos e para os fornecedores. O triste, é que não pagando os salários de junho a dezembro e o 13º dos funcionários naquele ano, foi um ato de covardia. Quem muito sofreu com tudo isso além do povo foi o comércio de Dianópolis. 
 
Hercy Filho já figurou como réu em mais de 20 processos nos fóruns de Dianópolis e Palmas (onde tem casa). Até a Junta Comercial do Tocantins já o processou. Os processos cobram do ex-prefeito dívidas de tudo que se possa imaginar, afinal, deixou centenas de calotes em empresas que prestaram serviços para a prefeitura em sua época, como para outros que prestaram serviços a ele. 
 
No entanto, um dos processos mais graves, é o que está às portas de seu desfecho e que cobram as multas aplicadas pelo Tribunal de Contas do Tocantins, o qual o ex- prefeito Hercy Filho vem tentando se esquivar a mais de 5 anos, porém tendo sido intimado agora em junho. No dia 02/10/12, a Procuradoria do Estado impugnou a contestação do ex-prefeito e manteve o pedido de execução, que agora está na fase de ser sentenciado.
 
Noutra parte, observa-se que se forem anulados os votos dos candidatos Régis Melo, somados aos de Hercy Filho, estes ultrapassam 50% (cinquenta por cento), dando ensejo, portanto, a novas eleições, na dinâmica do art. 224, do Código Eleitoral, que preceitua:
 

Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do País nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.

 
Nesse sentido, o TSE: Declarados nulos os votos por captação indevida (Art. 41-A da Lei nº 9.504/97), que, no conjunto, excedem a 50% dos votos válidos, determina-se a realização de novo pleito, não a posse do segundo colocado. (REspe nº 19759, TSE/PR, Rel. Min. Luiz Carlos Madeira. j. 10.12.2002, DJ 14.02.2003, p. 191).
 
O TSE reafirmou o entendimento de que, havendo renovação da eleição, o candidato que tiver dado causa à nulidade da eleição não poderá participar da renovação do pleito, em respeito ao princípio da razoabilidade (REspe n. 26.140/TSE, Rel. Min. Ari Pargendler, de 12.06.2007, DJ de 01.08.2007, p. 235).
 
Acerca da nulidade decretada como consequência do reconhecimento da pratica abusiva, colaciona-se julgado da temática em discussão:

Com efeito, permitir que candidatos que deram ensejo à anulação da primeira eleição, em decorrência de abuso de poder, participem do novo pleito, no mínimo, conflita com os princípios da moralidade e da razoabilidade. Isso estimularia a prática ilegítima daqueles que têm intenção de desequilibrar o pleito desde o começo, já cogitando a hipótese de que eventual cassação do registro ou diploma não lhes retiraria a condição de candidatos. (REspe 25.805/TSE, de 12.06.2007, Rel. Min. José Augusto Delgado, DJ de 21.08.2007, vol. 1, p. 136)

Conclui-se, que a hipótese que exsurge, para o caso em comento, são de eleições complementares. Uma, porque o candidato que poderá ser cassado ex officio tem a sua plataforma atingida, não podendo, por consequência, o vice assumir, e nem tampouco indicar substituto, para não se valer da própria torpeza. Outra, porque o segundo candidato mais votado, também, não poderá assumir, segundo entendimento pacificado pelo TSE, e regramentos da Lei de Ficha Limpa, que busca evitar conluios ou fraudes no processo. E, por fim, verifica-se que, com a cassação de Régis Melo, que obteve 3.805 votos, bem assim da impossibilidade de diplomação do segundo mais votado, Hercy Aires Rodrigues Filho, que obteve 2.948 votos, somam-se 6.753 de votos, que serão anulados, correspondendo a 70,60% dos votos válidos, apurados na eleição, que totalizaram 9.564. Entende-se, por isso, que diante das circunstâncias, acima elucidadas, dá-se ensejo à designação, no prazo de 20 a 40 dias, de novas eleições, para os candidatos remanescentes.

Frise-se que as eleições complementares não constituem fato novo, pois no atual momento em que a Justiça Brasileira busca higienizar o processo, afugentando velhas práticas ilícitas e políticos viciados, de acordo com o levantamento feito pelo site Congresso em Foco, 87 municípios poderão ter novas eleições. No Tocantins, Dianópolis, Colinas e Angico poderão realizá-las. Segundo o TSE, em virtude da cassação do mandato ou renúncia do titular, foram realizadas eleições suplementares em 11 municípios brasileiros no ano passado, exatamente metade dos 22 que tiveram novos pleitos realizados em 2006. Em agosto de 2007, o TSE informou que a Justiça Eleitoral tinha cassado 159 dos 5.562 prefeitos eleitos em 2004. Porém o número deve ser maior, pois não haviam sido computados no cálculo os dados dos TREs do Acre, de Pernambuco, do Sergipe e de Tocantins

Pondere-se, de outro lado, que os rumos do processo eleitoral em comento, podem ser bem diversos da modesta e despretensiosa abordagem jurídica, que se faz, neste particular. Muito embora caiba salientar que estas compilações estejam atreladas ao silogismo da mais recente e majoritária corrente doutrinária e jurisprudencial dos Tribunais Pátrios.
 
Aliás, uma derradeira reflexão merece ser feita neste particular: a verdade das urnas, nem sempre revela o mais justo espírito da democracia, mormente, quando se percebe, por parte do eleitorado, um voto surdo de protesto, para colmatar interesses particulares em detrimento do coletivo. Deve-se, lembrar, enfim, que no processo democrático, principalmente, as minorias devem se fazer representadas. Agregue a esse argumento, a título de ilustração, o fato de inúmeros votos vencidos, em acórdãos, constituírem o mote impelidor das mudanças necessárias e marco inovador de um ordenamento jurídico.  
Nunca é tarde recordar que vivemos sob o império das leis, num Estado democrático de Direito, apesar de alguns insistirem em impor um estado de exceção. Ressalte-se, ao final, que diversos eleitores e sociedade em Dianópolis, permanecem no aguardo de uma solução jurídica, acreditando que a justiça pode tardar, mas, espera-se, que jamais, falhe. Que esta, ponha fim ao impasse gerado, por atos ilícitos de determinados candidatos, para que, segundo a lição cristã, os justos e inocentes, não continuem a responder pelos atos ou equívocos dos culpados.

ZILMAR WOLNEY AIRES FILHO - Advogado e Professor Universitário, EspecialiSta - em Processo Civil e Mestre em Direito. Titular da cadeira n. 16 da Academia de Letras de Dianópolis-TO.

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