Estado deve assumir
responsabilidade constitucional de prover serviços de saúde eficientes.
Candidatos incluídos no cadastro de reserva do concurso público devem ser
utilizados, cumprindo assim decisão do STF
O Ministério Público Federal
no Tocantins (MPF/TO) propôs ação civil pública contra a União, o Estado do
Tocantins e a Associação Beneficente de Assistência Social e Hospitalar –
Pró-Saúde requerendo a nulidade dos contratos firmados para administrar 17
hospitais públicos no estado. Em caráter liminar, é requerida a suspensão dos
contratos de gestão firmados pelo Estado com a Pró-Saúde por intermédio da
Secretaria Estadual de Saúde (Sesau), bem como que o Estado assuma
imediatamente a prestação dos serviços até o desfecho da demanda, além do impedimento,
ao Estado do Tocantins e à União, de repassar recursos financeiros
correspondentes à Pró-Saúde.
Não há que se falar em danos
ao sistema público de saúde com o referido pleito, haja vista que também se
requer, em caráter liminar, que o Estado substitua o ente contratado na
prestação dos serviços. O impedimento de repasse financeiro pelo Ministério da
Saúde diz respeito apenas à execução dos contratos, não atingindo àqueles
serviço que sejam prestados diretamente pelo Estado. Para evitar mais danos à
população, é requerido prazo de 30 dias para que o Estado assuma a prestação
dos serviços transferidos por intermédio dos referidos contratos.
Como um dos pedidos
principais, o MPF requer que a Justiça Federal condene o Estado do Tocantins a
assumir a gerência dos 17 hospitais com a utilização dos candidatos incluídos
no cadastro de reserva do concurso público, conforme publicação na edição nº
2.798 do Diário Oficial do Estado e em respeito a decisão do Supremo Tribunal
Federal na ADI 4125.
Discute-se, também, o
destino da taxa de administração paga à Pró-Saúde no valor histórico de R$
13.525.842,45 cuja destinação final é absolutamente desconectada de ações e
serviços de saúde e não se sujeita a qualquer fiscalização.
A ação civil é consequência
de inquérito civil público instaurado com o objetivo de apurar a contratação da
Pró-Saúde, e considera como inevitável a conclusão que o Estado do Tocantins
optou pela celebração dos contratos para terceirizar serviços de saúde de sua
responsabilidade e provavelmente burlar o regime de licitações que lhe seria
imposto se tivesse firmado contrato de prestação de serviços. Os contratos
também serviriam para buscar a isenção de responsabilidades civis e
trabalhistas. O texto da ação civil pública considera como grave a tentativa do
Estado do Tocantins de abrir mão do encargo constitucional de prestar adequado
serviço de saúde e de garantir o direito de pleno acesso aos usuários.
A transferência do
gerenciamento e execução de serviços de saúde, nos moldes realizados, é
impossível frente a inteligência da Constituição Federal de 1988 e Lei n.
8080/90, desvirtuando qualquer tipo de autorização para a participação
complementar da inciativa privada no SUS.
Com atitudes como a
celebração dos contratos, o Estado está “lavando as mãos”, aponta o texto, não
se importando em legar à população um quadro estarrecedor de ineficiência da
saúde pública no momento em que a população mais precisa que o Estado se reorganize
e assuma, como prioridade institucional, a prestação de um serviço de saúde de
qualidade. A ação civil aponta que a simples leitura dos contratos permite
constatar que a organização social contratada não possui capacidade instalada
ou meios suficientes à prestação do serviço, utilizando-se das instalações do
Estado e nada contribuindo para o aumento da eficiência do serviço prestado
pelo mesmo.
Contratos sem embasamento
legal - Os 17 contratos foram celebrados pela Sesau com a Pró-Saúde para
gerência e execução de serviços de saúde nos hospitais regionais de Araguaçu,
Araguaína, Arapoema, Arraias, Dianópolis, Guaraí, Gurupi, Miracema, Paraíso,
Pedro Afonso e Porto Nacional, Hospital Regional Materno-Infantil Tia Dedé, no
Hospital Geral de Palmas Dr. Francisco Lopes, no Hospital de Pequeno Porte de
Alvorada, no Hospital e Maternidade Dona Regina, no Hospital de Doenças
Tropicais e no Hospital Infantil de Palmas, sob a forma de contrato de gestão,
no valor anual de R$ 258.484.789,00. Até março de 2012, foram destinados para o
custeio da avença recursos federais no montante de R$ 39.115.160,45,
provenientes do Fundo Nacional de Saúde.
A ação civil ressalta que
todo o processo de qualificação e contratação da Pró-Saúde ocorreu de forma
acelerada e precipitada, com ocorrências e circunstâncias que colocam sob
suspeita a lisura dos procedimentos. Apesar de existir expressa previsão de
utilização de recursos federais, não houve publicação no Diário Oficial da
União (DOU) do Comunicado de Interesse Público para possíveis interessados
lançarem-se à disputa do negócio, incorrendo em restrição da publicidade.
Irregularidades detectadas -
Foram identificadas as seguintes irregularidades na execução dos contratos:
descumprimento da regra constitucional que determina a prestação dos serviços
do Sistema Único de Saúde diretamente pelo Poder Público; desrespeito à decisão
do Conselho Estadual de Saúde, que rejeitou a proposta de terceirização;
indevido repasse de bens públicos a instituições privadas; gastos de recursos públicos
sem processo de licitação; seleção de organização social sem a realização de
licitação; impropriedade no objeto do contrato; falha na execução;
irregularidade na alocação de recursos.
Após questionamentos do
Ministério Público, o Tribunal de Contas da União examinou os 17 contratos e
detectou como irregularidades a própria lisura do processo de qualificação e
seleção da Pró-Saúde, ofensa aos dispositivos da Lei 9.637/1998, impropriedades
no objeto do contrato, deficiência na descrição dos serviços prestados,
obscuridade na economicidade dos contratos, inadequação dos modelos de
fiscalização e diversas falhas na execução dos contratos, dentro outros. O
relatório também apontou que preços praticados em contratações excederam os
valores praticados no mercado, sem a apresentação de nenhuma justificativa.
A Pró-Saúde contratou número
considerado elevado de consultorias, o que além de desvirtuar o objeto do
contrato de gestão, totalizam um valor de R$ 2.331.918,23, somente em quatro
meses. Também foi verificado possível sobrepreço nos serviços de tomografia e
mamografia na cidade de Araguaína, uma vez que os equipamentos que eram
próprios dos hospitais foram instalados em uma terceirizada, que cobra pelo
serviço e pelo aluguel dos equipamentos. Não há informações no sentido de que a
empresa adquiriu os referidos equipamentos.
A ação também ressalta as
constatações de auditoria do Denasus em relação à situação do Hospital Geral de
Palmas, que revelando a ineficiência do serviço prestado, constatou problemas
na terceirização dos serviços de distribuição dos medicamentos e insumos sem a
realização de inventário; insuficiência de estrutura física do almoxarifado e
da Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF) do HGP; na expressiva supressão
e vencimento de insumos e medicamentos com prejuízo ao erário superior à um
milhão de reais; insuficiência na gestão de recursos humanos e desatualização
dos livros de registro dos medicamentos sujeitos ao controle especial, da
certidão de regularidade técnica e dos laudos de inspeção sanitária.
No texto da ação civil
pública é considerado como fundamental que a decisão da Justiça resguarde a
legalidade do funcionamento da administração pública e possibilite o
cumprimento da decisão da ADI 4.125 e determine ao Estado do Tocantins que
assuma a gerência dos 17 hospitais com a utilização dos candidatos incluídos no
cadastro de reserva do concurso já realizado.
Dano moral coletivo - Para o
MPF/TO, valores milionários foram repassados à Pró-Saúde, porém a situação da
população que precisa da implementação de ações e serviços de saúde do Estado
beira ao caos. O direito à saúde, previsto no art. 6º e esculpido no art. 196
da Constituição Federal, foi mais uma vez esquecido e desrespeitado, a despeito
dos valores movimentados, acentuando o sofrimento daqueles que mais necessitam
da assistência do Estado. Os contratos e suas consequências acarretaram
prejuízos a uma coletividade de pessoas que esperavam as melhorias alardeadas
pelo Estado com a referida contratação, o que, sem dúvida alguma, gerou danos
morais coletivos que devem ser indenizados. Para que a condenação por danos
morais alcance um patamar de justiça para com a coletividade envolvida e cumpra
com seus objetivos, o MPF/TO considera que deve atingir no mínimo o valor de R$
2.500.000,00, que corresponde a menos de 1% do valor anual dos contratos.
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