O Brasil aproveitará o
potencial da Copa? NÃO.
O sucesso de uma Copa do
Mundo de futebol vai muito além do que se vê. Arenas lotadas e jogos
televisionados para o mundo todo representam apenas 10% desse grande
espetáculo, que une povos e faz o planeta vibrar em torno de uma paixão.
Para um país, sediar uma
Copa é uma oportunidade rara --a última no Brasil ocorreu há mais de 60 anos--
de estimular a economia, alavancar o turismo, melhorar a formação das pessoas,
expandir e aperfeiçoar a infraestrutura, elevando-a a um novo patamar de
acessibilidade.
Analisando esse conjunto de
ações, é fácil chegar a uma conclusão: não, o Brasil não aproveitará todo o
potencial da Copa.
Seria ingênuo imaginar que
uma Copa resolveria todos os problemas de uma nação, mas também não é
confortável constatar que o evento poderá aprofundar alguns deles. Assistimos
na televisão a um comercial de cerveja que transforma esse sentimento de
frustração do brasileiro em pessimismo. Mas não é pessimismo gratuito, é puro
realismo de quem vive o dia a dia das grandes cidades. Sim, imaginem, durante a
Copa, todos os nossos problemas estruturais agravados pelo fluxo de milhões de
pessoas!
O pessimismo do brasileiro é
calcado em fatos: a incapacidade dos gestores de planejar atrasou inúmeras
obras e, por tabela, encareceu em alguns bilhões o custo do Mundial --R$ 3,5
bilhões, para ser mais preciso--, segundo o último levantamento do Tribunal de
Contas da União (TCU). Para se ter uma ideia do que se poderia fazer com esses
bilhões excedentes, vamos fazer uma projeção.
Em 2010, o então presidente
Lula anunciou a construção de 141 novas escolas federais de educação
profissional ao custo total de R$ 1,1 bilhão. Os R$ 3,5 bilhões acrescidos ao
valor total da Copa dariam, portanto, para construir quase 500 novas escolas
técnicas no Brasil.
O excesso de gastos, no
entanto, não é o pior dos cenários. O tão falado legado social para a população
parece ter ficado só no papel. Quase todas as obras de transporte estão
atrasadas, a inauguração de algumas, inclusive, já foi remarcada para somente depois
do Mundial e outras foram canceladas.
Salvador foi a primeira
cidade-sede a cancelar uma obra de mobilidade. A construção de um corredor de
ônibus Bus Rapid Transport (BRT) foi riscada da lista de obras para 2014. Em
seguida, Brasília cancelou a construção do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).
Há ainda os problemas de
pouca visibilidade, mas grande impacto social, como as remoções involuntárias.
O tema foi destaque no jornal "The New York Times", em março passado.
O diário informou que 170 mil pessoas devem ser despejadas até a Copa do Mundo
e a Olimpíada, para dar lugar a intervenções urbanas para os eventos. O
problema é que as indenizações estão bem abaixo do valor de mercado e, quando
são oferecidas moradias, as casas ficam a até 60 km de distância do local de
origem.
Vale lembrar, ainda, a
naturalidade com que os projetos das arenas desrespeitam a lei que exige 4% dos
assentos para deficientes físicos e pessoas com mobilidade reduzida. Nos casos
em que os projetos preveem reserva de vagas, elas se limitam à margem de 1%,
mínimo exigido pela Fifa. Como se as decisões da Fifa fossem mais importantes
que a legislação do país.
Depois de ter rodado o mundo
inteiro e participado, in loco, de tantos mundiais, posso afirmar, com
convicção, que um país só é bom para os turistas se, antes, for bom para o seu
próprio povo.
Hoje, não consigo presumir
nenhum problema que inviabilize o evento, mas tenho certeza de que os
brasileiros ficarão decepcionados ao ver perdida mais uma ótima oportunidade de
tornar este país um lugar melhor para se viver.
ROMÁRIO FARIA, 47,
ex-jogador da seleção, tetra campeão mundial, é deputado federal (PSB-RJ) e
membro da Comissão de Turismo e Desporto da Câmara dos Deputados
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