Ninguém é obrigado a ser
candidato a presidente. Mas quem abraça a causa deve saber que sua vida está
sujeita a ser esquadrinhada — Mirian Cordeiro que o diga. O tucano Aécio Neves,
agora candidato oficial do PSDB, parece incomodado nesta missão.
Ainda pré-candidato, Aécio
começou mal. Decidiu fugir de perguntas incômodas, atacar as críticas como obra
de um submundo e acionar a Justiça para tentar limpar uma biografia no mínimo
controvertida. Nada a favor dos facínoras que inventam mentiras em redes
sociais para desqualificar adversários. Mas daí a ignorar questionamentos vai
uma distância enorme.
A repórter Malu Delgado, da
revista "piauí", prestou um belo serviço ao escrever um perfil do
tucano. Lá estão prós e contras, alinhados com sobriedade e rigor jornalístico.
Cada um que chegue às suas conclusões. Por enquanto, elas soam desfavoráveis ao
candidato.
Deixe-se de lado qualquer
falso moralismo. É direito do eleitor sabatinar quem se propõe a dirigir o
país. A fronteira entre o público e o privado se esmaece, sem que isso
signifique a condenação a priori de qualquer um.
Vídeos na internet mostram
práticas nada republicanas, como gostam de falar, por parte do então governador
de Minas Gerais. Entre outras façanhas em bares e blitze, montou uma tropa de
choque midiática para sufocar críticas.
Tanto fez que a guilhotina
tucana decapitou sem piedade inúmeros jornalistas em Minas Gerais. Os
testemunhos estão à disposição, basta querer ver e ouvir.
Sombras permanecem. A
questão das drogas é uma delas, e cabe ao candidato refutá-las ou não; ao
eleitor, mensurar a sinceridade dos depoimentos e até que ponto o tema
interfere na avaliação do postulante. Aécio tem se embaralhado frequentemente
no assunto. Adotou como refúgio a acusação de que tudo não passa de calúnias.
Ao vivo, acusou jornalistas reconhecidamente sérios de dar vazão a rumores
eletrônicos. Convenceu? Algo a conferir.
Na reportagem citada,
destaca-se um mistério. Uma verba de R$ 4,3 bilhões, supostamente destinada à
saúde, sumiu dos registros oficiais do Estado. Apesar de contabilizada na
propaganda, a quantia inexiste nos livros de quem teria investido o dinheiro.
O caso foi a arquivo sem ter
o mérito da questão examinado. A promotora autora da denúncia insiste na ação
de improbidade. Na falta de esclarecimentos dos acusados, aguarda-se o
veredicto da Justiça.
Esqueletos à parte, na
convenção de sábado (14) Aécio teve a chance de ao menos apresentar um programa
que justificasse a candidatura. Perda de tempo. O evento faria corar a banda de
música da finada UDN. Discursos mirabolantes se esforçaram para preencher o
vazio de alternativas.
Ouviram-se insistentemente
anátemas contra a corrupção. Ninguém se referiu, contudo, às peripécias do
mensalão mineiro e às manobras, também nada republicanas, do correligionário
Eduardo Azeredo para escapar de uma condenação.
O distinto público continua
sem saber se o salário mínimo vai mudar, se a aposentadoria fica como está, se
haverá um tarifaço e quais medidas um governo tucano propõe para melhorar o
bem-estar do povo. Ministérios serão cortados, esbraveja o senador. Mas quais?
A reeleição, comprada a peso de ouro pelo seu partido na gestão FHC, vai mesmo
acabar? A respeito disso tudo, o que ressoa é o eco das tais "medidas
impopulares".
Em lugar de propostas,
metáforas mal construídas que começam com brisa, crescem para ventania e acabam
em tsunami. Talvez porque Minas não tenha acesso ao mar.
Se quiser seguir em frente,
Aécio Neves está muito a dever. Saiu da zona de conforto mineira, em que a
imprensa é garroteada impiedosamente para abafar desmandos de gestão. O jogo
mudou, e o neto de Tancredo deve providenciar urgentemente garrafas para vender.
Não adianta apostar apenas
no erro do adversário. Amante de relógios caros, muitos deles capazes de quitar
com seu valor dezenas e dezenas de prestações de aspirantes a uma casa própria,
o tucano já deveria ter aprendido que quem sabe faz a hora, não espera
acontecer.
Artigo publicado no site da
Folha de S. Paulo em16-06-2014
Autor – Ricardo Melo
Fonte - http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ricardomelo/2014/06/1470970-os-esqueletos-de-aecio.shtml
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