terça-feira, 27 de maio de 2008

OPINIÃO: Dano Moral na Internet (Por Lucy Reichenbach)

Artigo em homenagem aos anônimos, covardes e sem credibilidade da Internet:

Nestes tempos em que a velocidade e amplitude de comunicação em tempo real tornou o planeta terra uma pequena aldeia, permitindo ao homo medius divulgar uma informação em questão de segundos, a facilidade de integração e interação entre os homens traz as mesmas vantagens e as desvantagens que assolam as
relações interpessoais diretas e reais.
Em qualquer país do mundo onde o regime político esteja assentado na democracia e no respeito aos direitos humanos há tutela civil e penal para a integridade da honra, da imagem, da privacidade entre outros direitos.

Em terras brasileiras, tais garantias vêm contempladas no artigo 5º. da Constituição Federal, in verbis:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
....
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
.....
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Destas garantias constitucionais decorrem a tutela penal e civil. Em sede criminal, o Código Penal Brasileiro prevê nos seus artigos 138 a 140:
CAPÍTULO V: DOS CRIMES CONTRA A HONRA
Calúnia -
Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:
Pena - detenção, de seis (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.
§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

Difamação
Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

Injúria
Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena - detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.

Disposições comuns
Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:
I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro;
II - contra funcionário público, em razão de suas funções;
III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria.

Mas como conceituar e distinguir a injuria, calúnia e difamação?
A grosso modo, a INJÚRIA se configura pela adjetivação pejorativa dirigida ao ofendido direta ou indiretamente.
Pratica o crime de DIFAMAÇÃO quem enxovalha a boa reputação do ofendido, enodoando tanto a imagem que este tem de si mesmo, quanto a que dele tem a comunidade onde esteja inserido;
E finalmente pratica CALÚNIA quem atribui a outrem a prática de fato definido como crime, sabendo-o de antemão inocente.

Mas as sanções não param aí. A prática desses crimes dão ensejo a indenização de danos materiais e morais e o nóvel Código Civil Brasileiro impõe a obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, quando a divulgadora for pessoa jurídica, conforme ressai do seu artigo 927

Art. 927: Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, é obrigado a repará-lo.
Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

A internet é mais um meio de comunicação e, nessa qualidade, o provedor que veiculou o conteúdo da ofensa responderá objetiva e solidariamente pelos danos causados ao ofendido. No caso, o provedor de conteúdo da internet, por se dedicar ao ramo de divulgação, exerce uma atividade de risco para ofensas à honra, imagem e privacidade de qualquer pessoa.
Contudo, remanesce dúvidas sobre a viabilidade de exigir indenização de danos morais em decorrência de ofensas à honra, à imagem, à privacidade e à segurança, quando praticadas e difundidas pela internet, destacadamente pela dificuldade de identificar o autor e provar as ofensas.
Já se faz luz, entretanto, já que os tribunais vêm condenando provedores a indenizar, entendendo que os meios de prova devem ser amplos e que é inexigível a prova pericial no computador do ofensor, quando esta se apresentar impossível.

1 PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA. PROVEDOR DE ACESSO E DE CONTEÚDO. INTERNET. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. 1 - É responsável o provedor de conteúdo da INTERNET (PSI) pela divulgação de matéria que viole direito e cause dano a outrem, seja por calúnia, difamação ou injúria, cabendo ao mesmo residir no pólo passivo da demanda onde a parte que se diz ofendida postula indenização por danos morais. Tal responsabilidade, contudo, não se reconhece ao provedor de conteúdo na hipótese em que este serve unicamente de meio de divulgação de revista, sendo esta perfeitamente identificável e responsável na forma da lei, por quaisquer manifestações de pensamento, ou mesmo de informação, que venham a causar violação de direito.
2 – Denunciação da lide. Cabível é a denunciação do autor de entrevista que, através de chat na Internet, manifesta pensamento sobre a honra de terceiro. Agravo parcialmente provido.
Agravo de Instrumento N° 70003035078
Décima Câmara Cível
Porto Alegre
Paulo Roberto Falcão - agravado(a)
Terra Networks Brasil S/A – agravante

2 “Os crimes praticados pela internet podem ser comprovados por muitos meios de provas, como interceptações telefônicas, testemunhas e outros e até por documento juntado aos autos, não constituindo a prova pericial nos computadores, difícil de ser realizada, o único meio

3 Em caso de não haver pronta identificação do autor das ofensas, cabe intentar ação cautelar contra o provedor de conteúdo para que este decline o nome do usuário e o IP, como já fez o goiano Roberto Balestra contra o Google3.
Desta forma, a responsabilidade civil do Provedor de Conteúdo não difere substancialmente da responsabilidade de qualquer outra empresa de comunicação televisiva, impressa ou falada.
Não se diga que tais empresas não têm como fiscalizar o conteúdo das mensagens, porque é perfeitamente possível o desenvolvimento de softwares capazes de identificar palavras ofensivas e bloqueá-las.

Para por cobro a tais velhacarias, a empresa de informática que divulgou as ofensas é solidariamente responsável pelo pagamento das indenizações, cabendo-lhe ação regressiva contra o usuário de seus serviços e autor dos danos, incluindo-se aí a recusa de prestar o serviço àquele que põe em risco a idoneidade da empresa.
A competência para julgar a ação é o domicilio do ofendido, onde repercutiu a tisna, por força do que dispõe o artigo 100, inciso V do Código de Processo Civil.

No Brasil, entretanto, à falta de normas específicas, a punição resultará da aplicação dos tipos penais atrás indicados e pela previsão constitucional de reparação de danos na esfera cível.
Mas a punição do infrator assume maior grau de dificuldade quando este e/ou o provedor de conteúdo tenham domicilio fora do país.
Mas isto não deve desanimar o ofendido, bastará aparelhar a ação no foro do seu domicilio e pedir a citação por Carta Rogatória, cuidando para que esta observe rigorosamente a legislação do país estrangeiro, v.g. o caso de Portugal.
Transitada em julgado a ação judicial é o momento de procurar o Tribunal competente do domicilio do ofensor para a homologação da sentença. A sentença homologada se reveste das qualidades de um título judicial, o que o habilita a aparelhar a execução do julgado contra seus ofensores.

O valor da indenização? Tratando-se de uma avaliação discricionária o quantum varia de juiz para juiz, mas todos tentam observar os seguintes parâmetros:

i. não deve ser exagerada a ponto de se converter em ruína do ofensor, mas deve
assumir significação diante das suas posses.
O objetivo é coibir ou ao menos desestimular práticas futuras e semelhantes;

ii. a fixação deve ter em consideração o nível econômico e a condição particular e
social do ofendido; o porte econômico do ofensor; as condições em que se deu a
ofensa; e o grau de culpa ou dolo do ofensor;

iii. a quantia fixada não pode representar "enriquecimento sem causa" ou "indevido", ou mesmo "exagerado”.

Importante realçar que os ofensores mais comuns nesse meio são aqueles que pouco valor dão à boa reputação ou imagem, seja porque comumente não as têm, seja porque normalmente são uns pobres diabos desapercebidos de qualquer patrimônio para garantir o pagamento das indenizações, situação das quais se valem para ofender impunemente.
Dir-se-á mais: isto é muito demorado e complexo. Eu direi: a justiça é mais ou menos demorada em todo o mundo, mas há valores maiores que se alevantam nestes casos, como os de se tomar de brios pela ofensa sofrida e concluir que, deste ponto de vista, pouco importa que demore, o que releva é punir o ofensor, tirando-lhe o sono por anos a fio.
Desde que a quantia não seja pífia, pouco importa qual o valor do pretium consolationis. O que vale é ver a honra lavada e desestimular os netófilos a repetir condutas levianas causando-lhe despesa com a contratação de advogados e o transtorno e sobressalto de responder a processo penal e civil com todos os ônus
decorrentes.

Nenhum comentário: